• Informe-se
  • Notícias do MPT/AL
  • Em decisão liminar, MPT/AL garante 22 medidas para Rio Largo implementar políticas públicas de combate ao trabalho infantil

Em decisão liminar, MPT/AL garante 22 medidas para Rio Largo implementar políticas públicas de combate ao trabalho infantil

Após ação civil pública do Ministério Público, 8ª Vara do Trabalho da Capital determina obrigações de fazer para Município garantir dignidade a crianças e adolescentes

Rio Largo/AL – No julgamento que pode se tornar um marco jurisprudencial na defesa da criança e do adolescente no estado, o Ministério Público do Trabalho em Alagoas (MPT/AL) obteve uma decisão liminar que determina 22 obrigações de fazer para o Município de Rio Largo implementar políticas públicas de combate ao trabalho infantil. O Juízo da 8ª Vara do Trabalho da Capital, que abrange a cidade da região metropolitana de Maceió, atendeu ao pedido de antecipação de tutela feito pelo MPT/AL em ação civil pública. 

Justificadas pela omissão do Município e insuficiência de políticas públicas de combate ao trabalho infantil, as medidas visam a destinação de recursos específicos, estruturação da rede municipal de proteção social e do sistema de garantia de direitos, planejamento da realização de estudos/diagnósticos/ações e capacitação de servidores que atuam em Rio Largo em torno da prevenção e na erradicação da mazela social. Entre as obrigações de fazer, está o incentivo à aprendizagem profissional como alternativa protegida de trabalho, capacitação e renda.

As medidas vão desde o compartilhamento de informações sobre como se encontra o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) no município até o acolhimento das crianças e adolescentes em escolas com jornada ampliada de atividades acadêmicas, culturais, esportivas e recreativas. As vítimas resgatadas também terão de ser cadastradas pelo poder público para serem incluídas em programas sociais/serviços do município e do governo federal.

Espera-se que, com a determinação judicial, Rio Largo possa finalmente elaborar o Plano Municipal de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil, efetivar o funcionamento dos Serviços de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV) e garantir a busca ativa de crianças e adolescentes que estão sendo explorados em feiras livres, coleta do lixo, comércio ambulante nas ruas e até mesmo na mendicância, tráfico de drogas e situações sexuais.

Para as famílias em situação de vulnerabilidade social, o Município de Rio Largo terá de implementar programas de geração de emprego, trabalho e renda, compatíveis com a vocação econômica local.

“O trabalho infantil, leia-se todo o trabalho de criança ou de adolescente antes da idade permitida ou fora das condições apropriadas, não se combate apenas com o resgate fortuito, casuístico, eventual das vítimas. É fundamental o engajamento de toda a rede de proteção e sistema de garantia de direitos para enfrentamento desta mazela social, cabendo ao Município a elaboração e efetivação de uma política pública concreta neste sentido, para diagnosticar e identificar, planejar, executar e monitorar ações de enfrentamento”, defendeu a procuradora do MPT/AL, Cláudia Soares, autora da ação civil pública.

Em caso de descumprimento das obrigações de fazer, o Município de Rio Largo deverá pagar uma multa no valor de R$ 20 mil por medida descumprida. O Juízo da 8ª Vara do Trabalho da Capital designou audiência entre as partes para o dia 20 de março, às 8h.

Trabalho infantil em Rio Largo

Segundo o Observatório de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil, iniciativa conjunta do MPT e da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que reúne dados oficiais de diversas instituições brasileiras, o Município de Rio Largo é o quarto com o maior índice de crianças e adolescentes explorados no Estado de Alagoas. As estatísticas foram reforçadas em diagnóstico preliminar realizado pela própria unidade do Ministério Público do Trabalho em Alagoas.

São 717 casos de crianças e adolescentes ocupados, na faixa etária entre 10 e 17 anos, sendo que destes, 152 casos estavam na fase etária de 10 e 13 anos e 74 casos em trabalho infantil doméstico. Se são muitas vítimas da mazela, são poucas as vagas de aprendizagem profissional preenchidas. Das 381 disponíveis, apenas 153 vagas estão ocupadas em Rio Largo.

No entanto, a despeito dos dados oficiais, o Município não registrou nenhuma família com a marcação de trabalho infantil no Cadastro Único (CadÚnico) do Governo Federal ou como beneficiária do Programa Bolsa Família. A análise desse quadro, para o MPT/AL, desponta para a invisibilidade dessa violação de direitos em Rio Largo, mesmo com agentes públicos municipais reconhecendo a existência.

O diagnóstico do MPT/AL foi elaborado a partir de inspeções técnicas e entrevistas junto aos órgãos/servidores que compõem à rede de proteção social do Rio Largo. Com base nele, o Ministério Público buscou um posicionamento da Prefeitura Municipal e realizou audiências administrativas não só para escutar os representantes da gestão sobre os casos de trabalho infantil como também para propor um termo de ajustamento da conduta de omissão.

Para surpresa do MPT/AL, a Prefeitura renunciou ao acordo, afirmando que o índice de trabalho infantil no município é baixo, “praticamente inexistente” e que a última identificação de caso ocorreu em 2021. Diante da negativa do termo de ajustamento de conduta e da própria realidade do trabalho infantil local, restou ao Ministério Público do Trabalho o ajuizamento da ação civil pública.

“A simples inexistência de qualquer identificação de trabalho infantil no Município, desde 2021, apenas reforça a inegável OMISSÃO do Município, que não adotou qualquer medida voltada à diminuição dos índices de trabalho infantil no Município, que ocupa o 4º lugar em número de criança se adolescentes trabalhando, dentro dos 102 municípios Alagoanos”, alegou Cláudia Soares.

As 22 medidas

Confira abaixo quais são as 22 medidas que o Município de Rio Largo terá de adotar para implementar políticas públicas de combate ao trabalho infantil:

1. Apresentar, no prazo de 30 dias, informações e documentos sobre a estrutura da equipe de referência do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) e os recursos utilizados em ações de visibilidade e combate ao trabalho infantil, tal como os destinados ao Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente;

2. Garantir, anualmente, no orçamento municipal, um percentual mínimo de 1% de todas as receitas previstas, para implementação das políticas públicas e do plano municipal de prevenção e erradicação do trabalho infantil, compreendendo, também, programas de formação profissional de adolescentes em situação de vulnerabilidade social e para atendimento das famílias cujos filhos estejam em situação de trabalho proibido;

3. Elaborar, no prazo de 180 dias, o Plano Municipal de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil, observando as diretrizes estratégicas e táticas nacionais, nos seguintes eixos: informação e mobilização, identificação dos focos de trabalho infantil, proteção social apoio à defesa e responsabilização e fluxo de informações e cooperação entre os três níveis de governo (municipal, estadual e federal);

4. Constituir, no prazo de 60 dias, e manter constituída, a equipe ou técnico de referência do PETI para atuar na gestão do programa;

5. Promover, periodicamente, pelo menos uma vez por ano, a capacitação de todos os profissionais dos órgãos e entidades do Sistema de Garantia dos Direitos da Crianças e do Adolescente;

6. Realizar, no prazo de 180 dias, o Diagnóstico Socioterritorial do Trabalho Infantil, com a participação de toda a rede de proteção à criança e ao adolescente;

7. Realizar, pelo menos uma vez ao mês, ações de busca ativa voltadas para o resgate de crianças e adolescentes explorados no trabalho, inclusive na zona rural;

8. Proceder, imediatamente, ao resgate e ao cadastro de crianças e adolescentes encontrados em situação de exploração do trabalho, notadamente nas feiras livres, na coleta do lixo ou lixão, na exploração sexual, no comércio ambulante nas ruas, na mendicância, com dados de suas famílias, para efeito de inclusão em programas sociais e de serviços do município e cadastramento no Cadastro Único do Governo Federal;

9. Providenciar, no prazo de 120 dias, o efetivo funcionamento dos Serviços de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV), bem como de quaisquer programas de atendimento de crianças e adolescentes em sistema de contraturno escolar, com padrões mínimos de qualidade em relação a infraestrutura e recursos humanos;

10. Adotar providências de fortalecimento do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente;

11. Assegurar a realização de reuniões periódicas de toda a rede de proteção social, tanto as locais quanto a municipal, pelo menos uma vez por mês, com ampla divulgação e elaboração de calendário anual;

12. Implementar, no prazo de 180 dias, medidas para fomentar a profissionalização de adolescentes e jovens do Município;

13. Implementar, no prazo de 180 dias, programas de geração de emprego, trabalho e renda para famílias em situação de vulnerabilidade social, compatíveis com a vocação econômica do município;

14. Fazer constar dos atos de autorização, permissão ou concessão de serviço público a obrigação da parte solicitante de que não poderá fazer uso da mão de obra de crianças e adolescentes em atividades que envolvam a permanência nas vias e logradouros públicos, incluindo espaços destinados a eventos de pequeno, médio e grande porte, sejam eles permanentes ou temporários;

15. Após a conclusão do Diagnóstico Socioterritorial, o Município deverá implementar, no prazo de dois anos, o atendimento em tempo integral nos Centros Municipais de Educação Infantil e nas escolas municipais do Ensino Fundamental I e II, iniciando pelos estabelecimentos escolares nos territórios de maior vulnerabilidade socioeconômica;

16. Realizar o efetivo resgate de todas as crianças e adolescentes que trabalhem ou exerçam atividades de comércio ambulante, ruas e logradouros público; nas propriedades rurais, inclusive em regime de economia familiar; exploração sexual e aliciados para o tráfico de substâncias entorpecentes, devendo o Município oferecer alternativas a serem realizadas, por meio da escola com jornada ampliada, para os resgatados;

17. Promover campanha anual de conscientização, com amplo alcance, acerca da idade mínima para o trabalho, do trabalho protegido, da proibição do trabalho infantil;

18. Manter ativa e atualizada a conta bancária do Fundo da Infância e Adolescência (FIA), utilizando os valores nela recebidos, em consonância com a legislação e regulamentação específica;

19. Capacitar diretores de escola, coordenadores pedagógicos, professores, monitores e outros servidores vinculados à Secretaria de Educação para a abordagem em sala de aula e com as famílias sobre os direitos das crianças e do adolescente, com foco na prevenção e erradicação do trabalho infantil;

20. Sensibilizar os referidos educadores para que identifiquem, por meio de atividades pedagógicas ou pesquisas com identificação dos alunos, as situações de exploração do trabalho de crianças e adolescentes, devendo tais informações serem encaminhadas à Rede de Proteção Social, por meio da Secretaria de Desenvolvimento Social;

21. Capacitar, pelo menos uma vez a cada semestre, todos os servidores vinculados à Secretaria Municipal de Saúde para identificação e notificação de agravos à saúde de crianças e adolescentes em situação de trabalho;

22. Adequar as instalações físicas dos CREAS, CRAS e Conselhos Tutelares, de modo a garantir um meio ambiente adequado à realização das atividades, em especial quanto à existência de salas para atendimento individualizados, retirada das áreas de mofo e reparos nas instalações sanitárias, assim como garantir material e equipamentos necessários ao desempenho das duas funções.

Leia a ação civil pública ajuizada pelo MPT/AL e a decisão liminar da 8ª Vara do Trabalho da Capital na íntegra.

Imprimir